Ironia

A sociedade ou o mercado, a mídia, o que quer que seja – é profundamente irônica com aqueles que, como eu, desejam um mundo melhor, baseado em valores menos superficiais e fúteis, e aplaudem quando uma obra de ficção defende esses valores. Chega a ser cruel.

Há alguns anos, o filme Pequena Miss Sunshine, uma produção relativamente pequena para os padrões de Hollywood, vinda do mercado dito alternativo, fez merecido sucesso de público e crítica ao contar a história de uma graciosa e carismática menina que disputa um concurso de miss infantil sem, aparentemente, preencher os pré-requisitos para tanto.

O concurso de miss infantil é uma bizarrice que sexualiza crianças prematuramente e as expõe ao que há de pior na sociedade ocidental em geral, mas sobretudo na norte-americana: a competição baseada na aparência física, a partir de critérios de beleza fechados, excludentes e rigorosos.

E Pequena Miss Sunshine o retrata exatamente assim. E vai além. Mostra como uma criança, com sua graça que é única e não pode ser mensurada, pode desafiar e subverter uma instituição conservadora tão simbólica e, com isso, levar toda sua família, até então um ente completamente desencontrado e envergonhado de seu aparente fracasso, a assumir ela também a defesa do diferente, do único, do humano.

Com tudo isso amarrado em um bom roteiro, direção competente e excelente elenco, Miss Sunshine nos comoveu a todos. (Ao menos a mim.)

Isso em 2006/2007.

Hoje, 2013, Abigail Breslin, a atriz de Pequena Miss Sunshine, um libelo contra a ditadura da beleza e dos padrões de comportamento, é notícia novamente.

E agora é porque ela, que seguiu com sucesso sua carreira de atriz, cresceu e “está bem diferente da garotinha de 2013”.
Sim, ela cresceu e, aos 16 anos, é uma adolescente bonita. Para os padrões de beleza, caretice e burrice que Miss Sunshine tão bem desancou.

Evidentemente que ela não tem culpa de nada. Pelo contrário, merece toda a sorte do mundo, que acompanha com muito mais afinco as atrizes bonitas. Mas o tom frívolo, cretino, quase doentio em se tratando de uma adolescente ainda com jeito de criança, das notícias que dão conta de seu crescimento, deixam-me profundamente desgostoso.

Uma das matérias que me motivaram a escrever este texto na ocasião:

http://www.purepeople.com.br/noticia/abigail-breslin-de-pequena-miss-sunshine-aparece-alta-e-magra-em-premiere_a3167/1#lt_source=external,manual

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